sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Tenho todas as doenças, menos Hipocondria !

A grande cobertura da mídia nacional sobre a pandemia da Gripe Suína tem colocado em evidência um grupo específico de pessoas : os hipocondríacos. Apesar de já se tratar de um termo comum no dia-a-dia, vale esclarecer melhor o que vem a ser a hipocondria :

" Hipocondria é o medo persistente de se ter uma doença séria. Uma pessoa com este distúrbio tende a interpretar sensações normais, funções corporais e sintomas leves como um sinal de uma doença grave. Por exemplo, uma pessoa pode temer que os sons normais da digestão, o fato de suar ou o aparecimento de uma marca na pele possam ser sinais de uma doença grave. " ( http://www.policlin.com.br/drpoli/148/ )

Trata-se de um distúrbio do qual ainda não sabemos as causas exatas, porém, tomando como base princípios da Análise do Comportamento ( como a multi-determinação do comportamento ) e o exemplo recente proporcionado pela pandemia de Gripe Suína, irei tomar a liberdade de especular e opinar sobre o assunto.

O hipocondríaco parece seguir o que chamamos de regra ( uma descrição verbal de uma contingência específica ). Essa regra parece dizer : " Ao menor sinal de dor, ou qualquer outra alteração fisiológica percebida, preocupe-se ! ". Em outras palavras, o sujeito preocupa-se constantemente com sensações "anormais" no corpo e teme o surgimento de uma doença mais séria ou - em alguns casos - a morte. Por hora, chamemos essa regra de regra hipocondríaca.
É importante notar que nesse sentido, a grande maioria das pessoas tem algum grau de hipocondria. O problema é quando isso se torna uma preocupação constante, e chega a prejudicar o convívio social e outras atividades cotidianas.

" " Todo mundo tem um certo grau de hipocondria, mas no máximo 7% daqueles que buscam o atendimento sem precisar podem ser classificados como hipocondríacos ", cita estudos norte-americanos o psiquiatra Sérgio de Barros Cabral. ( Notícia do site UOL : http://noticias.uol.com.br/cotidiano/2009/08/02/ult7403u271.jhtm ) "

Segundo o DSM-IV, para o sujeito ser considerado um hipocondríaco ele deve apresentar essa preocupação excessiva por um período de pelo menos 6 meses, apesar de exames médicos e neurológicos não apontarem nenhuma doença ou disfunção no organismo da pessoa.
A pergunta é : O que leva uma pessoa a seguir o tipo de regra citada acima ? O que justifica todo esse medo ?

A literatura psiquiatrica nos dá indícios de que o sujeito hipocondríaco, no decorrer de toda sua vida, se expôs em algum momento à situações que propiciam a formulação da tal regra hipocondríaca. Por exemplo, uma pessoa que durante sua juventude começou a sentir alguns pequenos sintomas, e de fato, manifestou alguma doença logo em seguida. Doença esta com um certo grau de seriedade e que marcou profundamente sua história de vida, seja pelas fortes dores ou por outros tipos de problemas.
Um outro exemplo comum é a morte de algum parente próximo, principalmente quando o sujeito acompanha de perto o desenrolar da doença.
Entretanto, a formulação da regra hipocondríaca pode ocorrer mesmo sem a exposição direta do sujeito a contingência, através de descrições de terceiros. Esses terceiros podem ser amigos, parentes, um grupo social ou até mesmo a mídia ( como é o caso do estado de hipocondria transitória causada pela nova Gripe Suína - vide reportagem do UOL com link citado acima ).

Evidente que a maioria das pessoas não se torna hipocondríaca com o acontecimento de apenas um desses fatos, mas a acontecimentos desse tipo somados à alguns outros traços da pessoa ( advindas de sua história de vida ) como transtorno obssesivo-compulsivo ou distúrbios de ansiedade, aumenta drasticamente a probabilidade da instauração de um quadro hipocondríaco. Podemos ainda mais o caráter multi-determinado da hipocondria com a citação de um artigo psiquiátrico :


" Vários autores têm destacado a alta freqüência de sintomas hipocondríacos, e três mecanismos poderiam explicar seu aparecimento: (a) a distorção cognitiva na avaliação da saúde; (b) o maior estado de alerta nos próprios processos fisiológicos; e (c) a ativação do sistema nervoso autônomo (SNA), cujas manifestações seriam interpretadas pelo paciente como disfuncionais. Todos esses mecanismos partiriam de um mesmo ponto comum: a ansiedade. Segundo Otto et al. a sensibilidade à ansiedade – medo de sintomas ansiosos, de sensações somáticas, tendência a responder ansiosamente à excitação ("arousal”) – seria o melhor fator preditivo de fenômenos hipocondríacos. " ( Coelho, C.L.S.; Ávila, L.A. 2007 )


Outro fator interessante, e que com certeza foi potencializado nos últimos anos, é a possibilidade do hipocondríaco ter sua crença reforçada com pesquisas feitas na Internet. Muitos hipocondríacos, assim que manifestam algum de seus sintomas, realizam buscas na Internet para verificar qual é a possível origem de tais manifestações. Imediatamente, ele encontra sites que associam a sua dor no peito por exemplo, a um iminente ataque cardíaco. Isso faz com que a preocupação inicial aumente ainda mais, e consequentemente, isso pode fazer com que o próprio sintoma fique mais evidente, mais intenso.
O quadro estabilizado de hipocondria, impede que mesmo resultados de exames cardiológicos por exemplo ( no caso de nosso paciente com dores no peito ) que não mostram nenhum problema, causem efeito positivo na pessoa. A pessoa não se convence com resultados positivos e frequentemente buscam uma segunda ou terceira opinião.


Em resumo, podemos constatar que são inúmeros os fatores que configuram um quadro de hipocondria, e estes podem variar em grau e intensidade.
Uma boa notícia é que atualmente, temos estudos que demonstram a grande eficácia da terapia cognitivo-comportamental no tratamento dessa síndrome, diminuindo as queixas dos pacientes,
bem como reduzindo os custos na área de saúde. (
Coelho, C.L.S.; Ávila, L.A. 2007 )






Como curiosidade disponibilizarei um link que mostra o "lado hipocondríaco" de um dos maiores cientistas de todos os tempos : Charles Darwin.


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Referências Bibliográficas :
Coelho, C.L.S.; Ávila, L.A. / Rev. Psiq. Clín 34 (6); 278-284, 2007 - Controvérias sobre a somatização
UOL : http://noticias.uol.com.br/cotidiano/2009/08/02/ult7403u271.jhtm


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